quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Dez anos de Genoma no Brasil



Há pouco mais de dez anos, em 13 de Julho de 2000, um consórcio de laboratórios paulistas publicou na revista Nature, com financiamento da FAPESP, o genoma completo da bactéria Xylella fastidiosa, que afeta o sistema vascular de diversas espécies de plantas (no caso, o isolado estudado infectava laranjeiras). Foi o primeiro genoma sequenciado e montado no país.

O aniversário de dez anos dessa publicação foi lembrado pela própria Nature (http://www.nature.com/nature/journal/v466/n7304/pdf/466295a.pdf). A principal conclusão da revista é que a história de sucesso do genoma da Xylella (publicação na Nature, criação de companhias de biotecnologia - posteriormente compradas pela Monsanto, desenvolvimento de patentes) não gerou muitas histórias semelhantes na década que se seguiu. Parece faltar, na visão da revista, coragem suficiente na ciência brasileira para que se investa em idéias arrojadas e, principalmente, em esforços maiores que liguem a ciência básica à ciência aplicada, ao menos se tratando de biotecnologia.

Numa época em que o sequenciamento de um genoma bacteriano era um esforço técnico considerável para garantir uma publicação (de capa) na Nature, o projeto Xylella foi também uma mostra do poder econômico (e político) da FAPESP. De fato, uma iniciativa semelhante comandada pelo CNPq (Projeto Genoma Nacional) em nível nacional é bem posterior ao projeto Xylella - os primeiros sequenciamentos do projeto do CNPq começaram a ser feitos apenas em 2001.

Mas o sucesso dos projetos Genoma feitos no Brasil vão além da questão da publicação e, mesmo, do desenvolvimento de patentes, embora essas sejam medidas inegavelmente importantes. Nesse tipo de projeto, ainda mais quando feito em consórcios de laboratórios, são também objetivos primários prover os laboratórios com equipamentos modernos e treinar os pesquisadores para lidar com esse tipo de dado. Para que ambos sejam usados em projetos subsequentes. Nesse sentido, acho que todos os projetos Genoma foram extremamente bem sucedidos no país.

E aqui tem algo importante; isso de “medir” sucesso. Quando essa medida vira um “número”, seja o número de publicações derivadas do projeto, o fator de impacto da revista, ou uma conta complicada do custo médio de cada publicação, toda a parte de formação de recursos humanos se perde, e seria um crime engessar a política científica com f´rmulas simplistas.

Tá, mas e o futuro? As técnicas usadas em genômica atualmente são muito diferentes do que aquelas de dez anos atrás (e geram um volume de dados absurdamente maior). Embora a Nature jogue a responsabilidade da inovação sobre os pesquisadores individuais (talvez com um pouco de razão), quem conseguiria aprovar um projeto individual ambicioso? Pouquíssimos pesquisadores! Já existem no país alguns grupos capazes de gerar e lidar com esses dados, mas são poucos. Talvez fosse interessante pensar se seria estrategicamente importante para a Biologia Molecular brasileira a criação (mas sim, alguém tem que propor...) de algum novo projeto nacional para equipar alguns laboratórios e, principalmente, formar gente capaz de fuçar nos dados disponíveis atualmente.

O Brasil fez um avanço tremendo há dez anos, mas as técnicas científicas mudam rapidamente. Não podemos nos arriscar a ficar para trás agora.

PS: Outra discussão pode ser: Num país de recursos financeiros limitados, é justo gastar uma pequena fortuna em um projetão de genética e biologia molecular, que de certa forma, já são as “primas ricas” nas ciências biológicas no país? Embora essa seja uma questão complicada (e eu tenha um viés óbvio por ser geneticista), acho que sim. Além de ser uma iniciativa que ajudaria a ligação da ciência básica com algo mais aplicado (que de fato, não é o forte por aqui), a formação de recursos humanos capazes de lidar com essas informações certamente contribuirá também na interação dessas novas técnicas com áreas menos aplicadas como a genética evolutiva e a genética da conservação.

2 comentários:

Cristine Gobbo disse...

Sou uma das herdeiras dos benefícios produzidos pelo projeto Genoma, já que os laboratórios que utilizei durante o mestrado foram equipados em grande parte com dinheiro vindo dele...
Sim, é verdade, precisamos de projetos do mesmo nível do projeto Genoma, não só para equipar laboratórios ou treinar pesquisadores, mas também para estabelecer redes de colaboração mútua entre laboratórios nacionais e, quem sabe em um futuro próximo, começarmos a praticar uma ciência pensada de forma estratégica, onde o trabalho em grupo torna possível avançar mais rápido na produção científica de qualidade do que o desenvolvimento de projetos isolados, desenhados ao sabor dos interesses pessoais de cada pesquisador.
Temos muito potencial para pesquisa científica, acredito que nos falte apenas um pouco mais de organização e visão estratégica.

Liliana Maria Rosa disse...

Toda a busca de excelência no que diz respeito ao desenvolvimento do conhecimento vale a pena, mesmo quando parece que alguma área, já destacada, esteja se destacando mais e mais com relação aoutras, isto é positivo. De nada adianta termos muitos vagões parados e nenhuma locomotiva.
Liliana

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